Compulsão à ocupação: uma face mortífera da contemporaneidade
Palavras-chave:
trauma, narcisismo, clivagem, compulsão à ocupação, psicanálise.Resumo
O objetivo deste artigo é investigar o circuito compulsivo de ocupação em que muitos sujeitos se encontram aprisionados na contemporaneidade. Partimos do pressuposto de que a aceleração e o excesso de atividades podem adquirir caráter patológico. Quando isso ocorre, essas manifestações nos parecem ligadas às problemáticas do trauma e do narcisismo. Examinamos, inicialmente, a constituição psíquica no âmbito do traumático, destacando as repercussões narcísicas diante da fragilidade dos investimentos objetais. Nesse sentido, articulamos a constituição narcísica de base traumática e o circuito mortífero subjacente à compulsão à ocupação. Em seguida, nos detemos no funcionamento psíquico do sujeito, sob o impacto traumático, alicerçado na clivagem e na busca pela sobrevivência através da ocupação compulsiva. Entendemos que a compulsão à ocupação e o cansaço extremo que ela engendra revelam um modo de sobrevivência psíquica baseado na descarga, na anestesia e no vazio afetivo. Esses casos nos alertam para a importância do olhar e do cuidado de um outro para que o sujeito possa se ocupar de si mesmo, para que possa viver e não apenas ocupar-se compulsivamente.Referências
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